Angústia
- João Miguel Carvalho
- 8 de jun. de 2017
- 2 min de leitura

Acordo todas as manhãs com um pensamento apenas. Até quando durará esta minha angústia? Somente mobília e aparelhos eletrónicos ocupam esta mansão que construí, sem alguém com quem a partilhar ou sequer miúdos para percorrerem os seus enormes corredores.
Todo o esforço de uma vida, repleta unicamente de posses, conquistas e histórias de ganância. Inconscientemente, afastei a única pessoa que genuinamente se interessou por mim e não pelo que tinha.
Fui atraiçoado pelo sucesso. Julguei que ele me traria tudo o resto, o essencial que só agora enxerguei o quão importante é. Naquela que foi a minha demanda pelo 'high-class livin’, fiquei com o mais pobre dos estatutos: o de pessoa solitária. E o pior é que já ninguém se interessa.
Perdi-me algures na jornada da vida, esqueci tudo o que era importante e foquei-me, de forma obsessiva, no que enriquece o olho, desprezando o que enriquece a alma, o espirito e o coração. Meu Deus, sinto um vazio que se espelha de dentro para fora e vagueia por entre todas estas divisões, apetrechadas de coisas inúteis. Anseio por contato humano, um simples abraço.
Ao longo do percurso, fiquei separado das emoções de um ser-humano: o amor, a amizade, a compaixão, a solidariedade. São meras palavras agora, que perderam por completo a sua conotação, para o meu intelecto compreender. O mesmo intelecto que me colocou no topo dos topos. Nem existe sequer alguém que me queira destronar, nem tão pouco sabem o meu nome. Não surpreende. Até eu já começo a esquece-lo, pois já faz algum tempo, desde a última vez que o disseram em voz alta.
Todas as noites me deito com outro pensamento, distinto daquele com que acordo. Amanhã vou corrigir isto tudo. Minutos depois penso – Já é tarde demais para isso. Esta angústia acompanhar-me-á até ao fim.
Edição: Pedro Espadinha
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