Crónicas de Portugal Contemporâneo #3
- Sofia Antunes
- 29 de mai. de 2017
- 2 min de leitura
‘O amor nos tempos de hoje’

Reflito diariamente sobre o que é o amor hoje em dia. Compreendo e aceito que a ascensão da palavra amor já não tenha o mesmo significado que tinha no tempo dos meus avós ou dos meus bisavós… Já não existe aquele amor fugaz, de quem canta serenatas à janela e pede a mão da amada aos seus pais.
Tudo bem, são os tempos modernos. Mas o mundo contemporâneo trouxe muitas coisas más. O consumo massificado de tudo e mais alguma coisa, o fastfood, a indústria ultrarrápida da música e do cinema, as lojas de roupa low cost, os móveis do Ikea… Tudo se tornou tão rápido, tão descartável, tão facilmente substituível. Até o amor.
Antigamente, quando uma lâmpada se fundia, comprávamos uma nova e resolvíamos o problema. Quando um caderno estava rasgado, colávamos com cola branca. Se o estrado da cama cedia, arranjávamos maneira de solucionar com novas ripas de madeira. Agora não. Compramos cadernos novos, camas novas, e na pior das hipóteses, uma casa nova.
Com isto tudo, queria apenas perceber como chegámos a este lugar tão triste que é substituirmos as pessoas que entram na nossa vida, como se estivessem resumidos a este consumo em massa. Temos um problema com a nossa relação e não nos questionamos em atirar tudo para trás, com a justificação de que, no meio de milhões de pessoas, decerto encontraremos outra que encaixe nas nossas exigências.
E vamos fazendo isso, uma, duas, três, inúmeras, infinitas vezes. Substituímos pessoas como se fossem lâmpadas de candeeiro.
O amor já não tem o mesmo valor, aquele entendimento. Até o divórcio agora é mais fácil que nunca, basta uns papéis e adeus, até à próxima.
Imagino que esta situação, ao ponto que chegou, tornou-se irreversível, não há remédio. Mas deixa-me triste pensar que não vai haver ninguém que me aceite com defeitos. Porque uma mínima escorregadela, uma discussão, um problema, e não há solução. Tudo porque somos todos móveis do Ikea, ou fast food do McDonald’s…
Fotografia: Carlos Ratinho
Edição: Pedro Espadinha
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